Descrição
Em 2021, a Penguin lançou uma nova edição de Caliban and the Witch, no selo Penguin Modern Classics. Em 2024, completam-se vinte anos de publicação da obra de Silvia Federici, que saiu originalmente pela Autonomedia. A Elefante juntou esses dois acontecimentos para fazer uma revisão completa — e merecida — desse grande livro, a partir da nova edição em inglês. Como houve uma série de mudanças no texto, o resultado é a segunda edição de Calibã e a bruxa: mulheres, corpo e acumulação primitiva. O projeto gráfico que todos amamos continua o mesmo, mas alteramos ligeiramente as cores da capa e do miolo.
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As acadêmicas feministas desenvolveram um esquema interpretativo que lança bastante luz sobre duas questões históricas muito importantes: como explicar a execução de centenas de milhares de “bruxas” no começo da Era Moderna, e por que o surgimento do capitalismo coincide com essa guerra contra as mulheres. Segundo esse esquema, a caça às bruxas buscou destruir o controle que as mulheres haviam exercido sobre sua própria função reprodutiva, e preparou o terreno para o desenvolvimento de um regime patriarcal mais opressor. Essa interpretação também defende que a caça às bruxas tinha raízes nas transformações sociais que acompanharam o surgimento do capitalismo. No entanto, as circunstâncias históricas específicas em que a perseguição às bruxas se desenvolveu — e as razões pelas quais o surgimento do capitalismo exigiu um ataque genocida contra as mulheres — ainda não tinham sido investigadas. Essa é a tarefa que empreendo em Calibã e a bruxa, começando pela análise da caça às bruxas no contexto das crises demográfica e econômica europeias dos séculos XVI e XVII e das políticas de terra e trabalho da época mercantilista. Meu esforço aqui é apenas um esboço da pesquisa que seria necessária para esclarecer as conexões mencionadas e, especialmente, a relação entre a caça às bruxas e o desenvolvimento contemporâneo de uma nova divisão sexual do trabalho que confinou as mulheres ao trabalho reprodutivo. No entanto, convém demonstrar que a perseguição às bruxas — assim como o tráfico de escravos e os cercamentos — constituiu um aspecto central da acumulação e da formação do proletariado moderno, tanto na Europa como no Novo Mundo.
— Silvia Federici
SOBRE a AUTORa
Silvia Federici é uma intelectual militante de tradição feminista marxista autônoma. Nascida na cidade italiana de Parma em 1942, mudou-se para os Estados Unidos em 1967, onde foi cofundadora do Coletivo Feminista Internacional, participou da Wages for Housework Campaign [Campanha pelo salário para o trabalho doméstico] e contribuiu com o coletivo Midnight Notes. Durante os anos 1980, foi professora na Universidade de Port Harcourt, na Nigéria, onde acompanhou a organização feminista Women in Nigeria e contribuiu para a criação do Comitê para a Liberdade Acadêmica na África. Na Nigéria, pôde ainda presenciar a implementação de uma série de ajustes estruturais patrocinada pelo Fundo Monetário Internacional e pelo Banco Mundial, processo no qual se inspirou para escrever sua obra-prima, Calibã e a bruxa. Atualmente, Silvia Federici é professora emérita da Universidade de Hofstra, em Nova York. É também autora de O ponto zero da revolução: trabalho doméstico, reprodução e luta feminista (Elefante, 2019) e Reencantando o mundo: feminismo e a política dos comuns (Elefante, 2022).