
Estabilização do poder, desestabilização do clima
Por Andreas Malm
Abaixo um trecho de Capital fóssil: a ascensão do motor a vapor e as raízes do aquecimento global, de Andreas Malm, lançamento de março da Elefante, que resume algumas ideias-chave do autor.
O “poder do homem sobre a natureza”, observou certa vez C. S. Lewis, “se revela como um poder exercido por alguns homens sobre outros, com a natureza como instrumento”. Aqui jazem as verdades fundamentais sobre a estrutura do poder social e sobre a degradação ambiental.
Com a declaração de Lewis como epígrafe, o antropólogo Richard Newbold Adams esboça, em um livro hoje quase esquecido, uma teoria que pretendia fundir esses dois aspectos: “É o controle do agente sobre o ambiente que constitui a base do poder social”. Mais especificamente, o próprio poder pode ser definido, sugere Adams, como o controle que um agente exerce “sobre algum conjunto de formas de energia”, que constitui “parte do ambiente significativo de outro agente”; com esse poder em mãos, A pode impor sua vontade sobre B.
O poder, em outras palavras, é uma relação tripartite. O ser humano A é superior ao ser humano B devido à utilização de forças da natureza C. Seria possível imaginar modos de poder em que o controle sobre a energia estritamente física e termodinâmica é, no máximo, de importância tangencial — pensemos na autoridade espiritual que um professor exerce sobre seus estudantes, ou na manipulação psicológica que um homem pode usar contra a pessoa com quem se relaciona —, mas, na esfera da produção, a energia é o que faz com que tudo funcione, e, por isso, o controle exercido sobre ela oferecerá sustentação para a potência como dominação.
De fato, todas as atividades econômicas são, em última instância, uma questão de conversão energética, tanto na manufatura quanto no transporte, na construção, no comércio ou na escavação: os objetos do mundo só podem ser transformados, transferidos e tratados, da forma que for, graças à energia. Nos pontos da produção de mercadorias em larga escala, essa força universal precisa estar concentrada. O poder exercido pelo capital sobre o trabalho está condicionado ao controle do primeiro sobre o segundo — particularmente sobre as formas mecânicas do segundo, que põem os instrumentos em movimento e sem as quais toda a produção seria interrompida. Também nesse contexto os trabalhadores humanos são diferentes dos pica-paus, dos bonobos e de todos os outros animais, independentemente de quão intricadas sejam as ferramentas que estes últimos possam construir: é só entre humanos que, “diferente dos animais, não é inviolável a unidade entre a força motivadora do trabalho e o trabalho em si mesmo”, nas palavras de Harry Braverman.
O castor B derruba uma árvore com sua própria força motriz; ele não opera um instrumento impelido por alguma corrente externa de energia capturada e disponibilizada pelo castor A. Devido a essa aptidão humana particular para a divisão energética, também pode vir à tona — sob certas circunstâncias históricas — a ideia de que o trabalho vivo pode ser substituído pelo trabalho morto das máquinas, que, caladas, respondem exclusivamente a seus mestres. Assim, a estrada para aprimorar o poder exercido sobre o trabalho passa pela natureza, e a resistência de B pode se voltar contra A, que talvez seja levado a cavar mais fundo em C a fim de preservar e expandir sua dominação.
Foi, em parte, o que ocorreu na mudança para o vapor: tendo o estoque [de carvão] como uma fonte de potência que podiam controlar, os capitalistas inflaram seus poderes contra os trabalhadores, e o capital se tornou mais potente nos dois sentidos do termo — como em “uma explosão potente” e “um proprietário superpotente”.
Por força de seu poder excepcional de barganha, os capitalistas puderam comprar carvão e motores a vapor ao lado de fatias de vidas humanas sobre as quais, no chão de fábrica, poderiam então exercer um poder reforçado nessa que foi uma construção original da economia fóssil, mas que se encaixa perfeitamente na teoria de Adams: a transição expressou “um aumento do controle sobre o ambiente” indistinguível de “um aumento do poder no interior do sistema humano”.
Além disso, no circuito seguinte do capital fóssil, cada unidade de CF aumenta ainda mais o poder do capital na medida em que serve como alavanca para a produção de mais valor. CF, aqui, é o combustível queimado que, progressivamente, eleva alguns humanos à condição de reis poderosos sobre as costas de outros, em contraste com a esfera de consumo fóssil: se pagarmos quinhentos euros em um voo de longa distância, nossa ação certamente gerará a emissão de gases de efeito estufa, mas não aumentará, em si mesma, nossas reivindicações futuras sobre o tempo ou os recursos de outras pessoas (gastamos nosso dinheiro, não o investimos). Somente quando a combustão for um momento na acumulação de capital — apenas se desempenhar um papel na geração de lucro — é que o agente irá adquirir, no fim do processo, um poder renovado e expandido para comprar e comandar a vida humana.
No capital fóssil, a consolidação do poder no topo avançaria então em conjunto com a dissipação do estoque. Ao contrário das concepções da moda sobre o poder como algo horizontalmente disperso por toda a sociedade, o padrão aqui seria uma centralização vertical de poder e potência (power) seguida pela difusão atmosférica de resíduos, tendo os rastros de carbono como índice de quão longe o processo avançou (imaginemos uma chaminé industrial). Com o conhecimento hoje disponível, o capital poderia ser responsabilizado por isso? De acordo com Steven Lukes, “os poderosos são aqueles a quem julgamos ou que podemos responsabilizar por resultados significativos”, mesmo que involuntários — na verdade, resultados involuntários podem ser “instâncias óbvias de poder”.
Uma parte — que ainda precisa ser quantitativamente especificada — do excesso de CO2 atualmente na atmosfera pode ser considerada uma materialização biogeoquímica do poder acumulado/dissipado pelo capital.
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