A utopia realizada da extrema direita

 

Desde a sua fundação Israel trabalhou diuturnamente para se tornar a utopia realizada da extrema direita. E conseguiu. Trata-se de um Estado militarista e colonial, onde os membros do grupo étnico-religioso dominante gozam de cidadania plena, enquanto os demais são rigidamente controlados e periodicamente massacrados. Em Laboratório Palestina, Antony Loewenstein explica como e por que isso aconteceu.

“A missão inicial de Israel era ser um farol em um século que sofreu catastroficamente os perigos do etnonacionalismo”, escreve. “Hoje, Israel inspira outras nações a aprofundar a sanha missionária de criar países com a mesma mentalidade que a sua. Nenhum deles será igual a Israel, mas seu modelo de chauvinismo e de orgulho descarado em priorizar os judeus acima de tudo é como uma embalagem lisa, facilmente transportável, que pode ser adaptada a uma infinidade de cenários.”

Israel ergueu-se sobre uma terra indelevelmente marcada pela morte e expulsão dos povos que habitavam a Palestina há gerações, em um episódio que ficou conhecido como Nakba — “catástrofe”, em árabe. O armamentismo e a violência estão no DNA do país, com um inimigo claro: os palestinos, vistos como bárbaros, enquanto Israel se coloca como o posto avançado da civilização, “a única democracia do Oriente Médio”.

Um vício de origem, que apenas se aprofundou. De Ben-Gurion (pai fundador que liderou a Nakba) a Ben-Gvir (ministro que dança ao som dos mísseis que destroem Gaza), a história de Israel é uma sucessão irrefreável de tentativas mais ou menos explícitas de limpeza étnica dos palestinos.

Para se livrar dessa população indesejada (ou mantê-la sob estrito controle), o Estado judeu, com dinheiro farto do Ocidente, dedicou-se a desenvolver uma poderosa indústria armamentista, além das mais modernas tecnologias de vigilância. Como era preciso buscar legitimação internacional para o nascente país, aliou-se aos governos e aos líderes mais sanguinários de cada época — muitos deles, inclusive, antissemitas —, oferecendo suas tecnologias de defesa em troca de apoio diplomático.

Assim, Tel Aviv estreitou laços com o regime do apartheid na África do Sul, com Pinochet no Chile, com a ditadura argentina (que perseguiu e matou quase dois mil judeus), com os genocidas de Ruanda e do Sudão, e hoje caminha lado a lado com Milei, Bolsonaro, Duterte, Modi e tantos outros expoentes do neofascismo, fornecendo ainda treinamento para as polícias e os exércitos mais violentos do mundo.

“Não estou nem aí para o que os gentios fazem das armas. O importante é que os judeus lucrem”, disse um conselheiro israelense na Guatemala na década de 1980. Estão lucrando. Até porque Israel utiliza a Palestina como laboratório para os seus novos equipamentos de defesa — cerne da argumentação deste livro.

Daí que não tenha nenhum interesse em desocupar o território ou trabalhar pela paz. Graças ao status quo, Israel consegue um selo muito valioso para seus artefatos bélicos: “testado em combate”. É a melhor maneira de vencer a concorrência internacional em um mundo cada vez mais hostil, marcado por conflitos regionais, fluxos migratórios e mudanças climáticas.

“O Laboratório Palestina de Israel prospera com a perturbação e a violência globais”, escreve Loewenstein, apontando para um futuro em que as nações se isolarão em guetos, no estilo israelense. “Isso significa muros mais altos e fronteiras mais rígidas, intensificação da vigilância de refugiados, do reconhecimento facial, do número de drones, de cercas inteligentes e de bancos de dados biométricos. Até 2025, estima-se que o complexo industrial de vigilância de fronteiras valerá 68 bilhões de dólares, e empresas israelenses estão seguramente entre as principais beneficiárias.”

É como disse o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, principal artífice do genocídio em curso na Palestina, citado como epígrafe da conclusão de Laboratório Palestina: “Eles [o mundo] se tornarão mais parecidos conosco do que nós nos tornaremos parecidos com eles”.

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