Depois daquela viagem

Por Tadeu Breda
editor

 

No livro que escreveu para contar os acontecimentos que se seguiram depois que sintetizou acidentalmente a dietilamina do ácido lisérgico, Albert Hofmann revela que, nos anos 1960, muitos jovens idealistas o procuraram em seu laboratório na Suíça pedindo ajuda para uma missão importantíssima: usar o LSD para mudar o mundo. Esses militantes lisérgicos estavam convictos de que, caso conseguissem fazer com que os presidentes dos Estados Unidos e da União Soviética tivessem uma viagem de ácido, acabariam com a Guerra Fria e inaugurariam uma era de paz, liberdade e felicidade planetária.

Hofmann não conseguiu ajudá-los na missão. Mas esse espírito revolucionário permaneceu no horizonte de muitos adeptos do LSD. Simeon Wade, autor de Foucault na Califórnia, foi um deles. Pacato professor de filosofia do interior da Califórnia, Wade foi menos pretensioso do que seus irmãos de armas psicodélicas. Em vez de despejar litros de LSD na caixa d’água da Casa Branca ou do Kremlin, planejou oferecer o elixir para um dos maiores pensadores da época: Michel Foucault. E nem precisou viajar a Paris para concretizar o plano.

Wade aproveitou uma visita do filósofo à Califórnia, onde passaria um tempo como professor visitante na Universidade Berkeley, e fez por onde convencê-lo a passar alguns poucos dias em Claremont, a poucos quilômetros de Los Angeles. Os atrativos que essa pequena cidade conservadora e poluída oferecia a alguém da importância de Foucault eram praticamente nulos. Wade, então, apostou nas paisagens naturais dos arredores, e convidou seu ídolo intelectual para uma viagem ao Vale da Morte.

Talvez porque Michelangelo Antonioni já havia rodado um filme na região, talvez porque estava farto da caretice da academia, ou por qualquer outra razão que nem Wade compreendeu, Foucault entusiasmou-se com a ideia. O objetivo final foi alcançado quando, em meio à noite estrelada do deserto, o maior nome da filosofia contemporânea topou experimentar LSD pela primeira vez, perguntando: “Quanto tempo demora para a poção fazer efeito?”.

Foucault na Califórnia é um livro tão instigante quanto a história que o cerca. Não fosse a curiosidade de uma estudante de pós-graduação, o manuscrito provavelmente teria se perdido para sempre — e seu autor continuaria sendo ridicularizado como lunático nos círculos universitários da Costa Oeste dos Estados Unidos. Por sorte, porém, e apesar da vida dura que levou por seguir seus sonhos, Wade guardava as fotos da viagem que fez com seu namorado, Michael Stoneman, e com Foucault ao Vale da Morte, além das cartas que trocou com o francês, de quem ficou muito amigo, nos anos posteriores.

Não se tratava de alucinação. Aquilo tudo tinha realmente acontecido. E, depois daquela viagem, nas palavras do próprio Foucault, seu trabalho intelectual jamais seria o mesmo.

 

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