Do concreto armado à crítica do capitalismo
Por Thiago Canettieri
prof. do Departamento de Urbanismo da UFMG
Publicado em Le Monde Diplomatique Brasil
Uma resenha de Concreto, de Anselm Jappe
Anselm Jappe é um pensador bastante eclético. Navegando por diferentes campos do conhecimento, mas sempre seguindo a estrela-guia da crítica da economia política, seus escritos fazem pensar. E esse é um mérito inegável, especialmente nos dias de hoje. O livro em questão, recém-publicado pela Editora Elefante como parte da Coleção Crise & Crítica, é um exemplo disso.
Partindo do desmoronamento do Viaduto Morandi, em Gênova, em agosto de 2018, Jappe demonstra a centralidade que o concreto, esse imprescindível material de construção da arquitetura moderna (em especial o concreto armado), desempenha na história do capitalismo. Ou seja, ao investigar o concreto armado como material de construção, Jappe, na verdade, fala da arquitetura moderna e, ao falar da arquitetura moderna, fala da própria modernidade, o que, por sua vez, é uma forma de criticar o capitalismo.
Como sabemos, o concreto armado se tornou a principal forma de construção do capitalismo tardio, especialmente entre os anos 1950 e 1970. Sem o concreto armado, não teríamos as cidades que conhecemos. A volumetria das construções não seria tão maciça, a altura dos prédios não seria tão elevada – e certamente as cidades seriam um tanto melhores para viver. Seja como for, vivemos num mundo de concreto.
O livro explora de modo bastante detalhado a história desse material, rastreando seus usos, seus desenvolvedores e as obras onde foi aplicado. Parte de seu argumento assenta-se na ideia da obsolescência programada, demonstrando que esse material não tem a mesma durabilidade de outros usados na construção civil e, portanto, com o decaimento de sua vida útil (que gira em torno de trinta a cinquenta anos), acaba levando a situações como o desmoronamento do viaduto. Esse nem me parece o ponto mais interessante.
O que me parece mais potente no argumento do livro é que o concreto pode ser considerado o lado concreto da abstração capitalista. Jappe, numa notinha de rodapé, o que é uma pena, considerando a pertinência de uma formulação desse tipo, lembra um grafite francês dos anos 1970: “Le béton est armé – et vous?” [O concreto está armado – e você?]. Na denúncia pichada nas paredes parisienses, o concreto aparece armado – ou melhor, ele próprio é usado como arma do capitalismo industrial.











