Descrição
Instante fugaz de afastamento diante um ataque, a esquiva promove a junção entre interior e exterior por antecipação da ação de outrem — um corpo que enfrenta ao escapar. Movimento que permite pensar, esquiva não se torna puro conceito, translúcido ao mundo; é antes signo imanente que promove a reflexão a partir de uma materialidade — o corpo em movimento. É aos moldes do “pensamento selvagem” que opera a reflexão trazida aqui por Lucas Keese dos Santos.
— Joana Cabral de Oliveira, na orelha
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Há algum tempo venho chamando os jurua para se tornarem “selvagens”. E aqui aponto que é difícil para vocês se tornarem Guarani Mbya. Contudo, o que podem fazer é apoiar de forma consciente e honesta caminhos para fortalecer a cultura guarani, que segue viva, seja nas aldeias mais abertas ao mundo externo ou naquelas mais dentro das matas, habitadas por uma diversidade de outros seres. Assim, vocês estarão ajudando também a si mesmos, aos seus filhos, aos seus queridos e queridas. E este livro pode certamente mostrar esperança em meio a tantas coisas ruins, quando precisamos nos lembrar dos tempos antigos, de muito movimento e força, para esquivar das atuais turbulências e destruições.
— Jera Guarani, na quarta capa
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Diante da imensa crise política em que nos vemos mergulhados, Lucas Keese dos Santos prefere perguntar aos Guarani Mbya, com quem convive há muitos anos, o que poderia ser a política. E a primeira resposta deles seria — em consonância com o que já havia notado Pierre Clastres (que esteve entre eles nos anos 1960) — que, em vez de buscá-la nas disputas por uma posição estável de poder e soberania, mais valeria investigar mecanismos capazes de conjurar modos de coerção e subordinação. Os Guarani Mbya indicaram ao autor que uma chave preciosa para compreender a sua política reside nos movimentos de uma dança, ou dança-luta, que eles chamam de “dança dos xondaro” (xondaro jeroky). Esses movimentos são os da esquiva, os de “fazer errar” (-jeavy uka) o adversário. Nesse ponto, sugere o autor, o xondaro guarani se encontraria com a capoeira. Ambos têm na esquiva uma característica central, são danças-lutas forjadas por populações com longa história de subjugação, que precisaram aprender a se esquivar para seguir existindo.
— Renato Sztutman
SOBRE o AUTOR
Lucas Keese dos Santos é mestre em antropologia social pela Universidade de São Paulo (USP). Trabalha e convive com os Guarani Mbya apoiando-os em suas lutas desde 2009, quando começou a se envolver em diversos projetos de fortalecimento cultural conduzidos pelas lideranças guarani e a assessorar suas organizações autônomas nos movimentos de luta pela terra, acompanhando de perto esse processo na Terra Indígena Tenondé Porã, no extremo sul da cidade de São Paulo. Em 2019, sua pesquisa foi premiada pela Sociedade de Antropologia das Terras Baixas da América do Sul (Salsa) e deu origem ao livro A esquiva do xondaro.