O sociólogo português Boaventura de Sousa Santos considera que a incorporação do Bem Viver na Constituição do Equador fez com que o país deixasse a “jaula da dependência e do subdesenvolvimento político e ideológico”. O professor da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra redigiu a orelha da edição brasileira de O Bem Viver – Uma oportunidade para imaginar outros mundos.
O autor do trabalho, o equatoriano Alberto Acosta, foi presidente da Assembleia Nacional que justamente colocou os Direitos da Natureza e o Buen Vivir na Constituição, feito inédito no mundo. Acosta foi ministro de Energia e Minas de Rafael Correa, com quem rompeu ao notar que se distanciava dos princípios fundadores do Alianza País, que desde 2007 ocupa a presidência da nação sul-americana.
Para Boaventura, o lançamento da Editora Elefante e da Autonomia Literária tem o mérito de ser didático sobre um princípio fundamental do século 21, baseado no evidente esgotamento da natureza pelo “desenvolvimento” capitalista.
Confira a íntegra do texto.
O livro de Alberto Acosta tem um objetivo didático: explicar as principais características do Bem Viver, conceito que nasce da visão de mundo dos povos indígenas, mas vai muito além. É um princípio característico do século 21, quando os limites ecológicos do desenvolvimento capitalista entraram com força na agenda global. Ao incorporar o Buen Vivir à sua Constituição, o Equador saiu da jaula da dependência e do subdesenvolvimento político e ideológico: afirmou-se como uma nação em pé de igualdade com as demais, decidida a compartilhar as causas pelas quais vale a pena lutar caso realmente haja futuro. A complexidade do Bem Viver atravessa todo o livro, e Acosta analisa suas propostas sob vários ângulos: como uma alternativa ao desenvolvimento; como uma dimensão dos Direitos da Natureza; como a matriz de uma nova economia solidária e plural de vocação pós-extrativista e pós-capitalista; e como uma semente que só germinará em um novo tipo de Estado, o Estado plurinacional, que é construído com a participação dos cidadãos, dos povos e das nacionalidades, por meio de diferentes formas de democracia – o que eu chamo “demodiversidade”. Acosta mostra ainda que o Bem Viver não é uma entidade exótica ou sem precedentes. Pelo contrário, é parte de uma problemática muito mais ampla, de uma conversa da Humanidade, em que estão participando intelectuais e movimentos sociais de Norte a Sul, do Ocidente ao Oriente. São questões controversas, que podem ser objeto de um debate muito enriquecedor. Aliás, o melhor que pode acontecer com este livro é justamente estimular discussões veementes e democráticas.