Hiroshima está em toda parte: conversa com Cristiane Nakagawa

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Por Paulo Silva Junior
Elefante na Sala

Hiroshima está em toda parte é um compilado de três livros escritos por Gunther Anders entre 1958 e 1964, lançado aqui pela Elefante neste 2025 e tema desta segunda temporada do nosso podcast, Especial Hiroshima, em cinco episódios. A convidada deste programa de número 1 é Cristiane Izumi Nakagawa, que é psicóloga social, psicanalista, doutora e pós-doutora pelo Instituto de Psicologia da USP. 

Sua tese de doutorado de 2020 se chama Trauma e Sentido, Culpa e Perdão, Vergonha e Honra nos Hibakushas – um estudo de testemunhos e seus paradoxos, que ganhou o prêmio Tese Destaque USP 2021. Ela lançou Órfãos de Hiroshima; Ayumi; Hiroshima e Nagasaki, Testemunho, Inscrição e Memórias das Catástrofes; e Hiroshima, a Catástrofe Atômica e Suas Testemunhas, todos os quatro pela Benjamin Editorial; além de Bonecas de Hiroshima, pela Bicas Editora.

Na primeira parte do podcast, você ouve trechos do livro. A segunda, que reproduzimos aqui também em texto, é uma conversa com a convidada.

Cristiane, sua pesquisa traz esses termos – trauma, sentido, culpa, perdão, vergonha, honra –, e isso é uma coisa que passa muito pelo relato do Anders, essa busca de procurar entender como esse evento repercutiu e repercute entre as pessoas afetadas pelas bombas. Como você chegou a esses conceitos e como essas palavras vão tentando explicar o sentimento dessas pessoas?

Então, essa pesquisa que você menciona, ela faz referência à minha pesquisa de doutorado, uma continuação da pesquisa de mestrado. E durante a pesquisa de mestrado, eu fiz uma primeira análise psicológica e psicanalítica das memórias dos hibakushas. Hibakusha é o termo que a gente usa em japonês para denominar os sobreviventes das bombas atômicas de Hiroshima e Nagasaki. E aí lá eu percebi que para compreender melhor essas memórias era muito necessário fazer um recuo histórico, um recuo político e científico contextualizando o desenvolvimento e a construção das primeiras armas atômicas que foram usadas no contexto da Segunda Guerra Mundial. Esse recuo segue o mesmo padrão do percurso, um percurso elaborativo, que foi realizado pelos próprios hibakusha. Então, os hibakusha, que foram mais longe nos seus processos de elaboração do trauma que sofreram em decorrência do bombardeio, sentiam a necessidade de compreender o que de fato foi o bombardeio atômico.

Dentro de muitas perguntas, as mais comuns entre eles eram como e por que algo semelhante foi idealizado pelo ser humano. E os sobreviventes sentiram a necessidade de compreender, nem que minimamente, como foi planejado e executado aquele evento que quase os matou e que matou grande parte da sua comunidade. Nesse sentido, conforme eu ia lendo, ouvindo e estudando as memórias dos hibakusha, eu fui percebendo que o fenômeno do trauma e os sentimentos que são intimamente ligados a ele, como a culpa e a vergonha, eram muito recorrentes nessas memórias.

Então, no doutorado, eu propus realizar entrevistas com o hibakusha focando nesses três elementos, o trauma, a culpa e a vergonha, numa tentativa de compreender o que esses fenômenos poderiam revelar sobre as vivências dos sobreviventes acerca do bombardeio atômico. E de fato foram muito reveladoras naquilo que diz respeito ao percurso que eles tiveram que realizar para dar conta dos sofrimentos psíquicos. Para te dar um exemplo, o sentimento da culpa que eu encontrei nessas memórias, que diziam respeito a uma rápida interpretação da angústia traumática. Ela acabou ganhando vários significados. A culpa como um peso. A culpa como um sofrimento auto-infligido, porque os sobreviventes queriam carregar, não queriam esquecer, não queriam deixar para trás os mortos. Ou a culpa como um tipo de pesar, onde no japonês eles usam a palavra moushiwakenai, que não é nem propriamente culpa nos termos ocidentais, porque diz respeito a um sentimento de constrangimento por sofrer de algo, de um bem que foi negado a tantos outros, nesse caso a vida. Ou a culpa como uma forma de reivindicar algum tipo de ação em uma situação em que nenhuma ação era possível, ou seja, numa reivindicação de existir, numa situação de extrema subjugação.

É muito interessante, porque a gente às vezes não tem noção dos significados para outras culturas. Eaí tem uma coisa que me chama a atenção, que é o choque do Anders diante da forma com que as pessoas se referem aos assassinos: ele chega a dizer que as pessoas falam da catástrofe como se fosse um terremoto, uma inundação. O que que você poderia, então, acrescentar sobre isso, essa forma da sociedade japonesa de olhar e de nomear esse evento?

Olha, sobre os sobreviventes tomarem um bombardeio como uma catástrofe semelhante a um terremoto, uma inundação e tal, meu palpite é que logo após o bombardeio, e nos anos seguintes ao bombardeio, muitos sobreviventes falam que não tiveram muito tempo, na verdade, para pensar sobre o que aconteceu na cidade. Porque havia uma nova guerra que eles estavam enfrentando no final do conflito mundial, que era a fome, por exemplo. Em Hiroshima, muitas crianças que ficaram órfãs, os órfãos de Hiroshima, elas morreram de fome, isso somado ao fato de que havia uma grande falta de informação. Porque a gente não pode esquecer que o Japão foi um país vencido, e naquele momento ele enfrentava a ocupação norte-americana, então era difícil para os hibakushas pensarem amplamente em qualquer coisa que ainda não fosse a sobrevivência.

E nesse ponto, eu também pensaria na questão do trauma. O trauma, para ser de alguma forma metabolizado, ele busca representações. E, numa suposição minha aqui, talvez naquele momento em que havia uma grande escassez de informações, talvez o que mais próximo fosse de uma representação para o grau de destruição que eles viveram no bombardeio era o grau de destruição provocada pelos fenômenos naturais. Afinal o Japão é uma ilha, né, que tem vulcão ativo, o Monte Fuji, que tem terremotos, que tem taifus, que tem tsunamis. Agora, me parece que o fato do Anders ter ido para o Japão um pouco mais de uma década depois do bombardeio fez com que ele encontrasse falas, interpretações, por assim dizer, muito diferentes daquelas que eu encontrei nas entrevistas que conduzi em Hiroshima entre 2009 e 2018. Porque nos sobreviventes que eu entrevistei tinha, sim, uma consciência de responsabilização, não só dos Estados Unidos e dos cientistas que participaram do projeto Manhattan, mas também uma responsabilização do próprio governo japonês por terem usado a população como bucha de canhão.

Nesse sentido também tinha um grande ressentimento. Aliás, eu estive em Hiroshima depois da visita do presidente Obama, e uma das grandes discussões naquele momento dizia respeito ao fato do Obama não ter assumido responsabilidade pela destruição da cidade em agosto de 1945 e por ter levado a maleta atômica para dentro do Parque da Paz. Isso fez com que muitos sobreviventes e muitos ativistas da causa antinuclear protestassem fortemente.

E eu penso que a diferença entre o que o Anders escutou e o que eu escutei nesse intervalo de décadas teve a ver com vários elementos. Por exemplo, logo depois da rendição do Japão, as cidades de Hiroshima e Nagasaki foram ocupadas pelo exército norte-americano e por pessoas ligadas ao projeto Manhattan. Eles foram às cidades, construíram laboratórios para investigação dos efeitos da radiação dos corpos humanos, e nesse sentido houve, naquela época, uma censura enorme de informações. Muitos sobreviventes vão dizer que só foram entrar em contato com o que é a bomba atômica, com o que é a radiação, décadas depois do bombardeio. Isso tudo apoiado por um preconceito que muitos hibakushas sofreram por serem sobreviventes, por conta dos sintomas causados pela radiação. Então muitos sobreviventes não revelaram que eram sobreviventes, senão eles poderiam ser prejudicados tanto na família (teria o casamento impedido, por exemplo), quanto no trabalho, porque muitas pessoas diziam que os sobreviventes eram preguiçosos, se cansavam muito rápido por conta da doença causada pela bomba.

Se eles não podiam revelar que eram sobreviventes, eles também não podiam manifestar seus afetos contra aqueles que os bombardearam. Mas assim, sim, me parece que também há elementos culturais, por exemplo, a vergonha. A vergonha é um sentimento que permeia amplamente as relações sociais na cultura japonesa, ou seja, há uma grande evitação de conflitos, uma tentativa quase a qualquer custo de evitar constranger o outro ou a si mesmo. O que torna difícil reclamar ou protestar pelos seus direitos, mas como em qualquer sociedade, como em qualquer cultura, há quem faça, né.

Sim, e tem uma outra coisa, um termo que aparece muito, que é a monstruosidade da bomba. Como a gente lida com essa ideia do monstruoso? Porque estamos falando de responsabilizar, de entender, mas ao mesmo tempo surge algo tão grandioso e a gente tende a dar um tratamento que é não humano… Chamar de algo monstruoso. 

A bomba, Paulo, é tão monstruosa e inumana que falar em explosão atômica, apesar de todos hoje em dia saberem superficialmente do que se trata, é ver que poucos conseguem, de fato, imaginar o que realmente é. Está fora da nossa possibilidade de imaginação. A bomba como monstro é lidar com Godzilla, é tirar completamente do campo do real, o que para a discussão geopolítica é um grande problema.

E sim, a bomba só existe porque nós humanos a idealizamos e a construímos. E nesse sentido eu penso no conceito de desumanização, da banalidade do mal, da Hannah Arendt. Nesse sentido, me parece que tem um paralelo entre a imagem que ela evoca da grande besta, quando a gente pensa nos soldados da SS, que ameaçavam e atacavam os judeus, por exemplo, com seus cães, pastores alemães, ferozes.

E a Hannah Arendt parece que diz para a gente que, numa cena que nem essa, quem perdeu a humanidade foram os SS, eles que se animalizaram, perderam a delicadeza do trato humano. As vítimas, os judeus que morreram, eles morreram humanizados. E me parece que é possível fazer uma comparação aqui com bombardeio atômico.

A bomba atômica foi construída e utilizada para matar inimigos sem rostos, e o poder delegado à bomba está no gigantesco número de mortes que ela é capaz de produzir em um só golpe. Como nos campos de concentração, as pessoas viraram números, houve lá um projeto de desumanização. Mas, no entanto, quem ficou desumanizado nesse ato não foram as milhares de vítimas, que morreram no ataque nuclear, e sim aqueles que, em um ato de dominação, lançaram a bomba sobre civis num momento da guerra em que o Japão já estava praticamente vencido. Isso, sim, é monstruoso, né?

E ainda em cima disso, a gente tende a normalizar um certo estado de guerra, né? O que você poderia dizer sobre nossa vida, então, enquanto sociedade, nesses 80 anos? Essa sensação de que apertando um botão a gente pode se destruir, essa vida em que novas gerações vão nascendo, já sabendo que existe uma capacidade de acabar com tudo isso e que foi criada por nós mesmos? Como que isso nos afeta, no fim das contas?

As bombas foram jogadas há 80 anos, mas como diz o Anders, Hiroshima está em toda parte, né? Ela inaugura uma nova era. A era atômica foi seguida pela Guerra Fria, e hoje a gente assiste ao que está acontecendo no Oriente, a gente percebe que a palavra nuclear é muito mencionada. Mas, de novo, parece que ainda não é algo que adentrou de fato, na imaginação, na representação das pessoas. Não suficientemente para que elas pudessem compreender realmente do que se trata. Mas não são todos que seguem anestesiados e normatizando os conflitos que acontecem ao redor do mundo. Há ainda muita oposição e resistência, e elas precisam seguir existindo. O próprio Anders fala que o meio para o fim de tudo já existe, nisso não tem possibilidade de se voltar atrás. Vai significar o suicídio da humanidade e cabe, no final das contas, a cada um de nós, lutar para que isso não aconteça. Compreendendo que essa luta é responsabilidade de todos e de cada um.

E como que as imagens acabam operando nisso? Claro que quando você fez sua pesquisa já havia internet, fotos circulando, coisa e tal, mas hoje a gente tem isso de forma muito extrema, a gente passa o dia assistindo cenas de violência, corpos mutilados, a qualquer toque no celular.

Nesse ponto, eu iria pela teoria crítica e pela psicanálise. Eu pensaria que a frieza e a anestesia são mecanismos de defesa, justamente numa tentativa de proteger a nossa psique de uma realidade extremamente violenta, que certamente nos fará sofrer. Pensando com o Adorno, eu diria que muitas vezes o sensacionalismo das imagens, dos textos e tal não permite que se produza, de fato, reflexões e elaborações. Muitas vezes se produz só choque, apenas choque. E como a psicanálise já ensina, aquilo que bate como um choque tem teor traumático, é capaz de paralisar.

Nesse sentido, eu estou falando de programas ou meios de comunicação sensacionalistas que se abastecem da violência e de uma violência que não produz nada além de choque. Muito diferente de se transmitir, divulgar imagens, narrativas, por exemplo, sobre o genocídio que está acontecendo na Palestina. Essas devem circular, devem denunciar, devem chocar e evocar as pessoas para as ruas. Não há meios leves e fáceis de se contar sobre um genocídio, mas me parece que a gente precisa transmitir e abordar essas informações e questões de uma tal forma que perturbe e evoque as pessoas, instigando elas a se posicionarem, a agirem, e não chocando e paralisando.

E como se faz isso? Eu penso que talvez um meio de fazer isso é através do apelo humano, alguma coisa que na narrativa ou na imagem evoque o outro a acessar, assim, muitas defesas, suas próprias dores e a sua própria humanidade. Que possa causar uma certa identificação, que leva a uma compreensão, de que esse problema é meu também. Se é humano me diz respeito, não me é estranho, não deveria ser estranho.

E para a gente fechar, vamos então com sua leitura, seu olhar para o evento em si, até porque o livro do Anders parte de uma mobilização já de anos depois do evento, não é exatamente um relato histórico de 1945. Então acho que é legal aproveitar seu trabalho para a gente localizar um pouco isso.

Legal, Paulo, então vou ler alguns parágrafos para poder resumir, o tanto quanto possível, o que foi a explosão atômica do ponto de vista principalmente das vítimas, dos sobreviventes.

Às oito e cinco da manhã do dia 6 de agosto de 1945, um dos tripulantes do bombardeiro Enola Gay, que foi responsável por levar a bomba de urânio Little Boy até o alvo em Hiroshima, informou dentro da aeronave que estavam a dez minutos do alvo. Às oito e doze, dentro do Enola Gay, ouviu-se que eles estavam ‘in point’, ou seja, sobre o alvo. Dois minutos depois, Ferebee, o responsável pelo bombardeio, que foi feito manualmente, acionou o botão que contaria 15 segundos para a liberação da bomba atômica.

Precisamente às oito horas, 15 minutos e 17 segundos, as portas do compartimento da bomba do Enola Gay se abriram e todos escutaram bomba liberada. A bomba caiu por 43 segundos e explodiu a 600 metros de altura em relação ao solo, acima do Hospital Shima. A explosão no ar e não no solo foi meticulosamente calculada pelos cientistas como uma forma de potencializar a explosão e os danos que ela causaria.

A explosão da bomba atômica liberou gigantescas quantidades de energia, que fizeram reluzir no céu um flash muito intenso, descrito por muitos sobreviventes como semelhante a um flash de magnésio utilizados pelas máquinas fotográficas, mas em proporções monstruosas. A luz emitida era tão forte que pôde ser vista a quilômetros de distância do epicentro. Yoshi Muraki estava dentro do prédio da sua escola quando ouviu o barulho dos B-29 e, em seguida, foi surpreendida por um clarão amarelo muito intenso e uma explosão ensurdecedora. Ela foi levantada do ar, perdeu a consciência. Já Teru Furuta não chegou a desmaiar. Ele estava saindo de casa quando viu o clarão e ouviu o barulho estremecedor. Foi jogado no chão, onde ficou deitado, protegendo seus olhos e seus ouvidos, até ter coragem de voltar a se mexer.

A explosão fez gerar no céu uma bola de fogo, semelhante a um pequeno sol, com um diâmetro de 280 metros, e atingiu uma temperatura de aproximadamente 3.500 graus Celsius. A diferença de pressão gerada no epicentro fez com que a bola de fogo fosse seguida de uma violenta explosão que liberou radiação em todas as direções, destruindo e queimando tudo em 1,5km ao redor do epicentro, causando destruição e incêndios parciais entre 1,5 e 4km ao redor do epicentro.

Em 10 segundos, a onda de choque atravessou 3,7km de distância ao redor do epicentro, exercendo uma força de 19 toneladas por metro quadrado nos primeiros 500 metros de distância. O resultado dessa onda foi a rápida queda de pressão no exato local da explosão, que como reflexo sugou violentamente uma grande quantidade de ar, dando origem a uma onda reversa na direção das áreas ao redor do ponto de explosão. Ergueu-se no céu uma nuvem imensa em formato de cogumelo. Essa nuvem retinha muita radiação e começava a acumular poeira dos incêndios que rapidamente se alastravam, consumindo toda a cidade.

Yoshi Muraki retoma a consciência e percebe que estava embaixo de uma calha de uma casa, mas estranhamente não da escola onde ela estava quando a bomba explodiu. Ela ficou muito confusa. Ela olhou para o lado e viu uma estudante inconsciente, com os olhos perfurados por este aço de vidro. Ela percebeu que o céu estava escuro. Ela viu que podia se mexer, saiu debaixo dos escombros e viu que tudo ao seu redor estava destruído. Ela ficou desnorteada, começou a caminhar e viu pessoas caminhando em filas, umas atrás das outras, com olhares sem vida, aparentemente sem saberem para onde estavam indo. Ela tomou um susto quando percebeu que todas as pessoas que caminhavam estavam nuas, estavam sujas, com os cabelos eriçados, queimados e com as suas peles descascando por conta do calor da carne. Por conta disso, muitos mantinham os braços estendidos para frente dos corpos, e ela disse que era uma cena assustadora.

Kamatsuka estava na capela esperando a missa de manhã, quando a explosão derrubou a estrutura do prédio onde ela estava e a soterrou debaixo das ruínas da capela. Ela conseguiu se desvencilhar dos entulhos e também viu uma Hiroshima totalmente destruída. Ela diz que reparou com muito assombro que não havia construções em pé e que não havia espaço para caminhar por conta dos detritos que se espalhavam por todos os lados. Ela conseguiu encontrar alguns colegas que também conseguiram se desvencilhar dos entulhos e juntos eles decidiram ir em direção ao refúgio. No mesmo local, Mitsuko Koshimizu acordou coberta de sangue da amiga, que alguns instantes antes estava conversando animadamente com ela e que agora estava morta do seu lado. Ela ficou assustada e percebendo que estava soterrada. Koshimizu se desvencilhou dos escombros e conseguiu sair debaixo do prédio demolido. Ela começou a caminhar quando ouviu outra amiga pedindo socorro.

Koshimizu conta que tentou, de todas as formas, remover os escombros que prendiam a amiga, mas não conseguiu. Ela diz que jamais vai se esquecer do desespero da amiga frente à possibilidade de morrer no fogo. A amiga dizia para ela: por favor, me ajude, corte a minha perna para me salvar. Ela lembra que a amiga emitiu um choro estridente, que identificou como de alguém que estava encarando a morte. O fogo que a cercava estava se aproximando muito rápido e Koshimizu diz: eu ainda posso ouvir a voz da minha amiga ressoando no meu ouvido. Tudo que eu pude dizer foi: eu sinto muito, eu realmente sinto muito por não poder te salvar. Lembra que, ao ouvir suas palavras, a amiga ficou num silêncio ensurdecedor. E esse silêncio agarrou Koshimizu de uma tal forma que, lá, ela já sabia que jamais seria capaz de esquecer dessa cena.

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