Por Séverine Kodjo-Grandvaux
Publicado em Le Monde
É uma das aberrações que a globalização e a busca pelo lucro mantêm em segredo que Larissa Bombardi denuncia em seu novo livro. “Os agrotóxicos proibidos na União Europeia (mas produzidos na UE) retornam ao seu solo através dos alimentos que a UE importa e consome, vindos dos países para os quais esses agrotóxicos são exportados, como o Brasil.” A geógrafa continua, afirmando que “certas substâncias que perturbam o sistema endócrino são encontradas em alimentos disponíveis nos mercados europeus (maçã, feijão seco, arroz, pera, pimenta, manga, etc.): o ciclo de envenenamento é assim tristemente fechado, colocando sistematicamente em risco a saúde da população europeia.”
No ensaio Agrotóxicos e colonialismo químico, um trabalho impactante, a pesquisadora apresenta números que sustentam o que pode ser considerado um escândalo sanitário. Enquanto a UE se tornou “a entidade mundial com a legislação mais restritiva quanto aos agrotóxicos, graças ao seu regulamento específico chamado Reach”, ela também é, “com 13,6 bilhões de dólares [12,5 bilhões de euros] vendidos ao exterior em 2020”, o maior produtor e exportador de pesticidas – inclusive daqueles cuja utilização é proibida em seu território –, superando a China (8 bilhões de dólares) e os Estados Unidos (4,5 bilhões de dólares).
Risco para a população
Maior consumidor de pesticidas do mundo, o Brasil utiliza 90% desses agrotóxicos em cinco culturas que servem muito pouco para a alimentação humana (soja, milho, algodão, pastagens e cana-de-açúcar), enquanto as “culturas agrícolas consideradas pilares da dieta alimentar brasileira – arroz, feijão preto (feijão) e mandioca” são negligenciadas.
Este é outro paradoxo levantado pela geógrafa brasileira, que teve de se exilar na Europa durante a presidência Bolsonaro: não apenas a industrialização da agricultura brasileira não contribuiu para reduzir a fome, que “mais que dobrou entre 2013 e 2020”, mas também resultou em um risco para as populações, especialmente camponesas e indígenas. Esse risco se manifesta em termos de saúde (aumento do número de pessoas intoxicadas e doentes), ecológico (desmatamento, redução da biodiversidade, inclusive no próprio coração da Amazônia), bem como através de expropriações forçadas e do aumento de assassinatos de “defensores e defensoras dos direitos socioambientais.”
Embora esse sistema beneficie certamente os grandes proprietários de terras brasileiros, ele favorece essencialmente, e antes de tudo, as “grandes indústrias transnacionais da agroquímica e das sementes”. Larissa Mies Bombardi vê nisso um “colonialismo químico” que coloca a América Latina em uma “posição subalterna” e beneficia uma Europa que se enriquece ao intoxicar as populações do Sul. Essa toxicidade, retornando ao mercado europeu através de um efeito bumerangue inesperado, faz com que Larissa Mies Bombardi questione todo o sistema de produção capitalista.