A Organização Mundial da Saúde declarou em março de 2020 que a pandemia de covid-19 era uma realidade global. Uma parte da população refugiou-se em casa, e nesse espaço precisou dar conta dos momentos de trabalho, estudo e lazer. O videogame, que já mobilizava bilhões de aficionados e uma indústria altamente lucrativa, tornou-se a terceira atividade digital mais popular no Brasil, atrás apenas de música e filmes. Muita gente que nunca havia se interessado em pilotar carros em alta velocidade, aniquilando inimigos, cumprindo missões, jogando a Copa do Mundo ou customizando a própria cidade se permitiu escolher um jogo para chamar de seu.
Em Videogame pandemia, o jornalista João Varella, jogador entusiasmado e por isso mesmo atento aos aspectos críticos dessa mídia, reúne ensaios produzidos em pleno surto de coronavírus, versando sobre temas que fisgam tanto os adeptos mais experientes como aqueles que olham para o universo gamer com desconfiança: a febre de jogos como o carismático Animal Crossing: New Horizons e o divertido Among Us (que se tornou ferramenta de interação para candidatos nas últimas eleições) e o aguardado (e decepcionante) Cyberpunk 2077; a chegada de novos consoles ao mesmo tempo que se desenham possibilidades de dar adeus às mídias físicas, com o aprimoramento dos serviços de streaming e a netflixização dos videogames; o aumento da representatividade de mulheres e pessoas negras nos roteiros; o aprimoramento dos recursos de acessibilidade para que pessoas com deficiência possam jogar com qualidade; e os desafios dos desenvolvedores independentes para driblar os gigantes.
Em tempos como estes, é inevitável que os jogos digitais absorvam novos padrões e dinâmicas sociais, enquanto os jogadores encontram nos desafios propostos pelos games uma via para expurgar sentimentos e necessidades que talvez nem saibam nomear. Daí vem a importância de se criar pontes com a cultura do videogame, ao contrário das visões que o senso comum reproduz sobre ela: “Acreditar que videogame só traz regozijo por meio de simulação de ação física, fantástica e violenta é tão improcedente quanto enxergar quadrinhos apenas como histórias de super-herói”, escreve o autor. “Há jogos (e talvez o vocábulo ‘jogo’ confunda em alguns momentos) que miram sentimentos como tristeza, luto e melancolia e são enriquecedores em sentido amplo”.